sábado, 31 de agosto de 2013

AGAPAN RELEMBRA 25 ANOS DA ‘TOMADA DA CHAMINÉ DO GASÔMETRO’



   



Na noite do dia 26 de agosto, um inesquecível evento promovido pela AGAPAN, a primeira entidade ecológica na qual militei a partir de 1975, lembrou na Câmara de Vereadores de Porto Alegre, no mesmo plenário onde exerci o mandato de vereador entre 1989 e 92, aquele que considero ser um dos mais emblemáticos protestos já feitos pelo movimento ecológico brasileiro – a ‘tomada da chaminé da usina do Gasômetro’, no centro de Porto Alegre. A usina com sua imponente chaminé de 124 metros de altura, que resistiu a todas as intempéries e tentativas de remoção, é o ícone da cidade, marca indelével de onde quer que se a aviste, assim como a Estátua da Liberdade o é para Nova Iorque e outras tantas similares mundo afora.


‘Não está morto quem peleia’ foi a tônica subliminar para a velha guarda do movimento ecológico, em especial a que integra a AGAPAN, primeira entidade ecológica do Brasil, que se reuniu festiva e emocionadamente naquela noite, assistindo a um documentário produzido pela TVCOM em memória aos 20 anos do protesto, ocorrido em 2008. 




O vídeo de 25 minutos foi seguido por um interessante debate sobre as conseqüências daquela epopeia, assim como as manifestações recentes, pois teve à mesa, Juliana Costa, uma representante do grupo de jovens que acampou nas imediações da usina, em junho, para impedir a derrubada de dezenas de árvores para efeito de ampliação de uma avenida, na trilha da cultura impositiva de ‘das auto’ sobre qualquer obstáculo que possa lhe atrapalhar o ‘nobre caminho’.

               
Juliana Costa e Gert Schinke



A conseqüência mais festejada por todos é a de que aquela heroica ação/protesto significou a garantia de sobrevivência do Parque Marinha do Brasil, o equivalente ao Central Park de Nova Iorque, fato que dispensa maiores comentários e sobre o incalculável valor que esta área significa para Porto Alegre e toda a região metropolitana, pois a ela também acodem milhares de pessoas nos finais de semana provindas das regiões vizinhas à capital. 

Lembrado como o ‘mentor intelectual’ da ação/protesto de 1988, senti-me extremamente lisonjeado, sendo aquele um momento de grande emoção para mim. 


A par de ter tido a ideia, fui um dos que arregaçou as mangas para arranjar os apetrechos e organizar de forma secreta o ‘comando ecológico’, grupo que tomaria a chaminé e levaria a informação à mídia. 



Nosso propósito, plenamente alcançado naquele dia, mediante um gigantesco e inesperado congestionamento na cidade, foi o de chamar a atenção do povo para a votação de uma ‘emenda de zoneamento urbano’ que justo naquele dia ocorreria na Câmara de Vereadores, com vistas a implantar um mega-projeto imobiliário ao estilo Doha, na orla do Rio Guaíba, eliminando o parque urbano que era previsto para a área. Vale lembrar que a mídia radiofônica foi decisiva para levar em tempo real, as informações da base da chaminé para a população, que via de regra, é alijada desse tipo de debate, conseguindo assim, a repercussão midiática necessária para que nossa ação tivesse sucesso político.
1988- Sem celular, smartphone ou afins, a comunicação entre os manifestantes do topo da chaminé e o pessoal da mídia lá embaixo, era feita através do "interpote"- potes plásticos de maionese contendo bilhetes, que quando atirados lá para baixo eram disputados pelo pessoal das rádios.


Lugar comum entre a ação de 25 anos atrás e o acampamento em defesa das árvores na base da usina, foi a semelhança do tratamento dado pela polícia, como relatado por Juliana Costa do Ocupa Árvore.



Juliana foi uma das que subiu nas árvores da perimetral em junho em frente à Usina do Gasômetro e relatou a ocupação do espaço por 40 dias que foi feito por cerca de 50 jovens acampados (na média diária), mas que foram retirados com brutal truculência numa chuvosa madrugada por parte de mais de 300 policiais fortemente armados e que fizeram todo tipo de humilhação aos mesmos, como destruir todos seus equipamentos e documentos, além de prisão incomunicável por várias horas, em aberta transgressão à lei. Obra de Tarso Genro (PT) e Fortunati (PDT), respectivamente governador e prefeito, sendo que o último compareceu há 25 anos quando era deputado estadual para se solidarizar com nosso movimento da tomada da chaminé. 




Não é ‘bárbara’ essa mutação política? Alguém da platéia também lembrou uma ‘notável coincidência’ no fato de Alceu Collares, então prefeito de Porto Alegre em 1988, e o atual José Fortunati, serem ambos do PDT que, a par do extremo desenvolvimentismo semelhante ao do PT, tem como característica comum o uso da força policial com brutalidade para debelar protestos de ações dos movimentos sociais que ‘atrapalham’ seus projetos. 
Em 1988 os ‘capangas de Collares’ (como era chamada a ‘guarda pretoriana’ que o acompanhava diuturnamente) não só agrediram brutalmente nós manifestantes, como também os jornalistas e a todos que se atravessavam em seu caminho, fazendo do pátio da Câmara de Vereadores na tarde do dia 17.08.88 um palco de escaramuças digno de um bangue-bangue, reprisando as refregas mano a mano entre chimangos e maragatos da revolução gaúcha. Os métodos das elites apenas se repetem, para sarcasmo da história...

O debate que se seguiu aos depoimentos girou, dentre outras coisas, sobre a nossa 'democracia de fachada', falsa por todos os aspectos, onde só leva vantagem aquele que se subordina aos mandos do capital e dos interesses dos políticos que estão no poder, mostrando que, ao invés de a polícia proteger TODOS os cidadãos, ainda que protestem democrática e pacificamente, ela tem lado sim - O DOS PODEROSOS, e não o do povo. Esse cenário ficou evidente em todas as manifestações de junho/julho. Também ficou claro que a repressão se abate com redobrada força sobre aquelas manifestações que colidem frontalmente com os interesses econômicos das elites, em contraposição àquelas que tratam de direitos humanos e de minorias, como os dos movimentos GLTB e em ‘defesa dos animais’, ‘marcha das vadias’ ou ‘marcha da maconha’, que recebem notável ‘tratamento diferenciado’ por parte das polícias, "mais humano" por assim dizer, quando não até mesmo ostensiva ajuda, o que deveria ser para todos, por pressuposto. MAS TUDO MUDA QUANDO O PROTESTO CONFLITUA COM O CAPITAL !!! 



Revendo velhos companheiros de luta ecológica e amigos, além de gente nova no pedaço, aproveitei para lançar a proposta do "Movimento de Refundação Ecológica", algo que se tornou imprescindível diante da agenda e cenário políticos, procurando separar aqueles grupos seriamente engajados na luta ecológica transformadora daqueles que praticam mera maquiagem verde, em franca colaboração com o sistema ecopredatório. Também a ocasião, foi propícia para divulgar meu livro ECOPLAMENTO, onde faço a defesa detalhada do 'movimento de refundação ecológica', conseqüência lógica da minha teoria e detalhado ao final do livro.

terça-feira, 27 de agosto de 2013

"Emergência" em Fukushima Daiichi

Artigo original em:
07 de agosto de 2013


O que significa a palavra "emergência" na usina de Fukushima Daiichi? Esta palavra foi tão utilizada nos últimos dois anos e meio que é difícil acreditar em uma situação de emergência, quando Fukushima não preocupa mais muita gente, há muito tempo. E, no entanto, esta palavra acaba de ser utilizada pelo responsável da segurança nuclear no Japão: segundo a agência Reuters, o chefe de um grupo de trabalho em Fukushima da ARN – Autoridade de Regulação Nuclear Japão – anunciou segunda-feira que Fukushima estava em estado de "emergência". E Shinji Kinjo não é alguém que se preocupa, habitualmente: em 15 Março de 2011, depois da terceira explosão na usina de Fukushima Daiichi, esse especialista disse que o aumento da radioatividade não teria efeitos imediatos sobre a saúde. Isso mostra o quanto suas declarações públicas de hoje são preocupantes. Para compreender o porquê desse homem sair do seu silencio habitual e questionar duramente a operadora Tepco, temos que voltar aos acontecimentos iniciados no mês passado. Este artigo tem como objetivo fazer um balanço da situação relativa às águas contaminadas da usina de Fukushima Daiichi.
O gerenciamento das águas de Fukushima Daiichi

Para bem apreender a situação, é necessário conhecer o estado de coisas. Resumindo, em março de 2011, os porões da usina foram completamente inundados pelo tsunami, o que resultou, inicialmente, na presença abundante de água salgada. Em seguida, ela sofreu três meltdowns/colapsos (coração de fusão) – ou seja, o mais temido dos acidentes da indústria nuclear – cada um formando um corium de cerca de 70 a 90 toneladas. Pior ainda, pelo menos um dos coriums atravessou a cuba do reator e só foi parar e se solidificar no fundo do recinto de contenção; essa é a versão oficial. No entanto, até hoje a Tepco não foi capaz de mostrar nenhuma informação que comprove tal versão. Pois existe uma outra hipótese: o corium pode ter atravessado a balsa de fundação, o que o teria levado à camada geológica que contém o lençol freático. Essa hipótese também não foi provada por ninguém, pois é impossível contar com informações, uma vez que a Tepco costuma reter uma grande parte dos dados. Mas essa hipótese é cada vez mais plausível, vamos ver o porquê.

A rega dos núcleos fundidos

A Tepco rega os núcleos derretidos – ou, ao menos, a sua suposta localização nos tanques – para remover o calor residual. Isso requer cerca de 360 m3 de água por dia. A água, em vez de ficar nos tambores de contenção, espalha-se nos porões da usina, possivelmente devido a falhas causadas pelo terremoto de 11 de março de 2011. Estima-se que 100.000 toneladas de água contaminada estão estagnadas no subsolo da usina. A contaminação dessa água é muito grande: as últimas medições registram 5,7 milhões Bq/L para a Unidade Um, 36 milhões de Bq/L para a Unidade 2, e 46 milhões de Bq/L para a unidade 3.

As águas subterrâneas

Uma outra fonte de água, incontrolável, foi rapidamente constatada, é a do lençol freático, que chega de todos os lados: 400 m3 de água por dia, que se mistura e que se contamina à que é utilizada para o resfriamento.

Para que o nível da água não suba e que o local não se torne um pântano radioativo, Tepco é obrigada a bombear permanentemente a água dos porões. Esta água é então enviada a sistemas complexos de tratamento, que remove a salinidade e retira parte dos radionuclídeos. A água é então armazenada em tanques, e uma parte é usada novamente para o resfriamento. Com efeito, para evitar de relançar a água radioativa no oceano, ela é armazenada no site. Atualmente, existem cerca de 1.000 tanques contendo cerca de 300.000 m3 de água contaminada. Em 5 de agosto de 2013, a Tepco anunciou ter ainda 60 mil m3 de armazenamento disponível, o que lhe permitiria se manter até dezembro de 2013. No longo prazo, dentro de dois anos, a Tepco planeja aumentar sua capacidade de armazenamento para 700 mil m 3.
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A luta contra o abastecimento de água
Para evitar ter que tratar muita água, a Tepco instalou 12 poços reatores em montante, para bombear a água do lençol freático antes de entrar no porão. Essa operação, na verdade, permite o bombeamento de apenas 100 m3/dia. Mas como o local onde estão chumbados esses poços foi contaminado por vazamentos de água altamente radioativa de tanques subterrâneos que o operador tinha cavado no chão – para reduzir o custo dos tanques de metal – ainda não existe autorização para liberar a água no mar. De fato, após o tumulto causado pela liberação de 11.500 m3 de água radioativa no oceano em março de 2011, Tepco prometeu não fazê-lo mais sem a autorização dos pescadores. Mas hoje, os pescadores perderam a confiança e eles provavelmente têm razão.
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Parede impermeável e vazamentos em direção ao mar
Planejada há dois anos, a construção de uma parede impermeável de aço e concreto, entre a usina e o mar, deveria estar concluída, hoje. Mas isso não aconteceu. Provavelmente por razões financeiras (obviamente custa muito caro) e humanas (dificuldade de recrutar trabalhadores), a construção da barreira está longe de terminar.
http://wm.imguol.com/v1/blank.gifNa precipitação decorrente das descobertas de julho, a Tepco optou por paredes químicas. Esta técnica já tinha sido utilizada em 2011: naquela época, injetou-se no solo silicato de sódio (Na2SiO3), composto químico que tem a particularidade de solidificar o solo e torná-lo tão duro quanto o vidro. É possível que se trate do mesmo processo. De qualquer forma, há uma razão técnica que impede de realizar essa estrutura até o nível do solo. A parede química de 16 m de profundidade chega até 1,80 m da superfície.
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Ora, ao que parece, a utilização desta técnica em uma extensão de 100 metros provocou a subida do nível da água subterrânea em jusante da usina ao nível da unidade 2: o nível de água em um dos poços aumentou um metro desde o início de julho. Isso parece bastante lógico, uma vez que as águas subterrâneas se movem da montanha para o mar. Ao encontrar um obstáculo, há uma elevação do nível. O grande problema é que esta água é fortemente contaminada, Tepco reconheceu que "é possível que a água tenha começado a passar por cima da parede subterrânea", o que, provavelmente, signifique que ela já está chegando ao oceano.
Água contaminada no oceano

As medições realizadas no mar nos últimos dois anos e meio mostram que a radioatividade não baixa perto da usina de Fukushima Daiichi, embora o decréscimo radioativo e a diluição deveriam ter provocado uma redução significativa da poluição. Poderíamos supor, portanto, que a usina liberava cursos d’água radioativos, mas a Tepco recusa-se, até hoje, a admitir tal situação. Somente em 22 de julho de 2013 a operadora reconheceu uma poluição do Pacífico e, em 2 de agosto, a Tepco anunciou que a quantidade total de trítium lançado a partir de maio de 2011 foi algo entre 20.000 e 40.000 bilhões de becquerels (20 e 40 TBq). De fato, depois do vazamento de 2011 que eles lutaram para estancar, a Tepco tinha se comprometido a bloquear as tubulações, o que, no entanto, nunca foi feito durante dois anos, a situação, em tese, tendo sido "estabilizada".

Percebe-se em todos os momentos que a operadora não é um serviço público – mesmo sendo o estado japonês o acionista majoritário –, mas sim uma empresa comercial que, sempre buscando lucros, evita ao máximo ter despesas. Finalmente, em 7 de agosto de 2013, o governo, através da Agência de Recursos Naturais e Energia, anuncia que 300 m 3 de água contaminada são lançados, diariamente, no mar.
Bombeamento de emergência

O conjunto de dutos-túneis-trincheiras a jusante da usina contém cerca de 15.000 m3 de água contaminada. Diante da insistência da NRA, a Tepco se comprometeu a começar a bombeá-los a partir do próximo fim de semana, apesar de que já tinham programado este novo projeto apenas para o final de agosto. Uma vez que que o tanque que deveria recolher essa água adicional perto da unidade 2 ainda não foi construído, isso reduzirá automaticamente a capacidade de armazenamento do local.

Desde o mês de junho de 2013, a Tepco tinha constatado um aumento da radioatividade na água de um conduto situado próximo da Unidade 2. Mas, em julho, a situação foi de pânico: duas amostras tiradas de trincheiras que servem, de fato, de reservatórios de água contaminada desde o início do desastre, deram informações impressionantes: a primeira amostragem (19 de Julho de 2013) resultou em 36 bilhões de Bq/m3 de césio 134/137, e a segunda (26 de Julho de 2013) deu 2.350 bilhões de Bq/m3. Daí o estado de emergência declarado pelo NRA.


As trincheiras que transbordam

Atualmente, há evidências de que a água contaminada passa sobre a barreira química. Pode-se pensar também que ela passe por baixo e também pelos lados dessa barreira, uma vez que esse muro químico é intermitente. Pode-se presumir, igualmente, que, durante os últimos dois anos todos os comunicados da Tepco dizendo que o lençol freático teria se mantido “comportadamente” sob a usina são, na realidade, uma enorme farsa. Em recente programa na Asahi TV, especialistas denunciaram os projetos desastrosos da operadora.
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Até o momento, nenhuma ação visando conter a água contaminada foi eficaz. Elas foram feitas a despeito do senso comum. No entanto, desde o início muitos especialistas reclamam a necessidade de um recipiente subterrâneo fechado, uma espécie de sarcófago subterrâneo gigantesco cuja construção levaria dois anos. Se esta decisão tivesse sido tomada há dois anos, o lançamento de água contaminada no Oceano Pacífico talvez pudesse ter sido estancado, hoje. Talvez, pois não sabemos o quão profundo deveria ficar esse sarcófago. A usina de Fukushima repousa sobre camadas sedimentares arenosas e é provável que a água possa facilmente fluir em profundidades insuspeitas.

O corium saiu da cuba?

Segundo a ACROnique de Fukushima de 1o de agosto, os últimos resultados da medição da contaminação de césio da água dessas valas mostram concentrações em centenas de milhões de becquerels por litro no reator nº2. Quanto mais a profundamente se extrai a água, mais ela é radioativa, relata também Gen4: registra-se até 950 milhões de becquerels por litro. Essa constatação sugere que a água que resfria os coriums sai do tanque de contenção e libera seus radionuclídeos continuamente nas águas subterrâneas. Uma vez que a Tepco mente por omissão, permanentemente, em todas as frentes e desde o início da crise, é razoável pensar que se trata da última anedota da operadora maldita.
O que fazer agora?

Agora que o governo revelou que 300 m3/dia de água contaminada são lançados continuamente ao mar, o que será possível fazer? Torna-se extremamente crítico trabalhar neste entorno cada vez mais radioativo. Apesar dos hidro-geólogos da NRA dedicarem-se a trabalhar nesse assunto, raramente a teoria é consistente com o campo. A água termina sempre por se infiltrar e se instalar. Seria perigoso se o solo onde está construída a usina se tornasse um lamaçal radioativo, pois ele poderia se tornar instável. A solução a curto prazo é ainda bombear e armazenar. A solução a longo prazo ainda não é conhecida. Ou então, é preciso fazer como o IRSN e continuarmos otimistas independentemente do que aconteça: "Tendo em vista os valores observados nas águas subterrâneas, o significado da radiação lançada ao oceano pelo site deveria ser buscado no significado terrestre global, considerando as medidas tomadas e que os eventuais impactos ambientais tendem a permanecer localizados na vizinhança imediata da usina, devido à alta capacidade de diluição do oceano.” (IRSN, 10 de julho de 2013).http://wm.imguol.com/v1/blank.gif



Deslizamento da área de Fukushima em direção ao oceano?

20 de agosto de 2013
Texto enviado por Marc Humber, ex-diretor do Centro de Cultura Francesa em Tokio.

Os reservatórios primeiro, os reatores 1 a 4 em seguida, depois o mar. Quando terminava uma nota informativa sobre a situação nuclear no Japão, vejo a atenção pública japonesa e internacional novamente atraída por (foto do Japan Times) um incidente, de fato um “pequeno” incidente tendo em vista a ameaça real.

Na verdade, a ameaça real vem do sub-solo da área da usina que está se tornando um verdadeiro pântano radioativo à beira mar. Se nada for feito, esse pântano vai se estender pouco a pouco ao longo de quilômetros à beira e dentro do mar. Fragilizando as fundações do local, ele carrega o risco, em caso de terremoto, de um deslizamento de terra capaz de carregar toda a usina ou parte dela para o oceano.

O incidente sobre o qual a atenção está focalizada hoje tem a ver com uma das partes constituintes desse pântano. TEPCO acaba de reconhecer o fato de que 300m3 de água altamente contaminada escaparam de um dos 900 reservatórios de estocagem e chegou ao mar. Esses reservatórios estão alojados em grandes bacias de concreto, com as beiradas de 30cm de altura (ver foto) permitindo recuperar a água, se elas escaparem – a estocagem é, em princípio, temporária e os reservatórios, utilizados durante os últimos dois anos, não são garantidos por período maior de cinco anos. Válvulas permitem remover a água da chuva das bacias de concreto. Não se sabe exatamente de onde sai o vazamento – como a radioatividade está muito elevada, não se faz uma busca demorada – recolhe-se o resto para colocá-lo em um outro reservatório. TEPCO lamenta (não o acidente mas) a ansiedade causada à população. Sabe-se também que ao menos 300m3 de água contaminada chegam ao mar a cada dia.

Para a TEPCO, o acidente que a NRA declara às autoridades internacionais não é especialmente importante (trata-se do quarto vazamento de um reservatório, mas o primeiro detectado tão tardiamente) e é verdade que há aspectos mais graves, como apontado acima (e explicado no meu texto). Qual seria a situação se numerosos reservatórios passassem a vazar, qual é futuro desse mar radioativo constituído por esses 900 reservatórios? Por que tanta água contaminada? Porque os coriums dos reatores 1 à 3 devem ser resfriados, porque isso não basta e que é preciso injetar azoto sendo que 20% tornam-se radioativos e se espalham na atmosfera. Porque a água injetada torna-se radioativa, e que uma grande parte não é recuperada, vai chegar à camada freática e, em seguida, ao mar. Ela caminha através não somente dos vazamentos dos encanamentos, dos sub solos e das trincheiras abertas pela TEPCO, mas certamente também através de vazamentos das estruturas de concreto sob os reatores que os coriums deslocaram, no mínimo criando fendas que se alargaram e continuam crescendo, fazendo com que a camada freática entre em contato com os reservatórios dos reatores.

Nada é feito porque a TEPCO, as autoridades japonesas e internacionais, se recusam a considerar que se trata da situação com maior veracidade. Reconhecê-la seria desencadear a ansiedade do público e bem provavelmente relançar a desconfiança se não a hostilidade ao nuclear. Aos responsáveis parece preferível minimizar, negar a ameaça real que significa a usina de Fukushima. Enfrentar corretamente a situação exigiria trabalhos e despesas faraônicos e deslocar a população para colocá-la em segurança. Esse“negacionismo” nuclear pode conduzir a uma catástrofe planetária.